Figueira da Foz, 5 de julho de 2023 –
Era uma vez um mundo. Um mundo diferente, é certo; um mundo de eventos organizados de forma diferente.
Neste mundo diferente, cada um é consciente de uma característica diferente do que, neste mundo, consideramos normal. Essa característica não é a idade, o mérito ou o dinheiro. Não é o poder ou a altura, o peso ou a largura de cada um. Esse atributo é a força que cada um consegue suportar.
Existem vários sistemas para a medir. Pode-se fazer uso do quilograma, do volt, da vontade ou de outros sistemas de medição. Pode ser peso físico ou outro. E toda a gente tem um mesmo objetivo comum: chegar ao fim do dia carregando a maior quantidade de peso possível.
Quando começam o dia, no local de partida da jornada apresenta-se a gente agrupada em classes distintas.
Em primeiro lugar, há os que conseguem suportar um enorme peso. Como se sabem acima da média, conservam uma auto imagem que passa impune aos poucos deterioramentos interiores.
Depois, há os que se consideram mais que os outros e acabam por perder o fôlego a meio do caminho. Mesmo descansando, são incapazes de continuar e ultrapassar os que entretanto já os passaram. Ficam a ver navios, como Napoleão no Tejo.
De seguida, aparecem os que, em conjunto uns com os outros, são capazes de transportar grandes pesos, auto instigando-se votos de coragem. São os que conseguem melhor conservar um estado de espírito constante e chegam ao estado de êxtase ao final do dia. Sabem que, com a quantidade certa de energia e entusiasmo, o esforço basta para finalizarem a sorrir entre eles, e a perspetiva de voltar no dia seguinte faz os seus olhos brilharem.
Logo no fim chegam os que são mais fracos, que passam a jornada a dar ânimo e ajuda aos mais fortes ou medianos. Estes perdem assim a própria força de vontade, oferecendo a pouca força física e ainda massacrando a força interior, dada a todos na mesma medida.
Quem me dera a mim viver neste mundo, guardada de qualquer outro sentimento ou circunstância. Quem me dera a mim nem conseguir pensar numa história assim, ter sequer um pensamento divagante. Quem me dera não saber ainda como escrevê-lo, descrevê-lo, como enquadrá-lo em palavras de forma esquemática e mecânica. Quem me dera ser por ser, estar estando e sonhar acordada a cada instante à espera de acordar disto que é a vida. Quem me dera dar dando a dor ao dador da dádiva que é a vida. Quem. Quem?
Sofia Rainho
